António Maio em entrevista ao jornal Açoriano Oriental

Aumenta crédito concedido pela Caixa Económica da Misericórdia para o turismo

 

Passado o período da crise financeira, o paradigma do crédito na Região mudou?
R.: Efetivamente a crise financeira deixou marcas na economia, e naturalmente no Sistema Financeiro, que ao nível estrutural quer de exigência funcional, que obrigam a uma atitude e perspetiva de concessão de crédito naturalmente diferentes.
No que concerne à situação da Região Autónoma dos Açores (RAA), e tendo por base os dados divulgados pelo Serviço Regional de Estatística dos Açores (SREA) referentes ao passado mês de maio, constata-se uma evolução favorável da economia açoriana, com o Indicador de Atividade Económica desse mês a registar um valor de 1,5%, o que se traduz num aumento de 1.1% face ao mês de abril.). Não obstante, apesar da evolução favorável e à semelhança da realidade nacional, um dos desafios que a Região continua a enfrentar é a elevada taxa de desemprego, que ronda 9,3% no final do 1º trimestre do corrente ano, apesar de se verificar a sua diminuição face ao período homólogo e se tivermos em conta que no 1º trimestre de 2014 se registou um valor de 18%, percebe-se o ajustamento conseguido neste indicador.
Apesar da evolução positiva destes indicadores, o montante total de crédito concedido na RAA tem vindo a decrescer ligeiramente desde o último trimestre de 2016, voltando a verificar-se essa tendência no final do 1º trimestre de 2017 (à data ainda não se encontra disponível informação do Banco de Portugal referente ao 2º trimestre). Esta tendência pode revelar, por um lado, uma certa contenção por parte das famílias bem como das empresas e uma certa apreensão face aos acontecimentos dos últimos anos de profunda crise económica e financeira mundial. Por outro lado, poderá ser revelador de um maior rigor e cuidado por parte das próprias Instituições de Crédito na concessão de crédito, no cumprimento das melhores práticas de mercado de acordo com as orientações do Regulador e uma mais adequada ponderação do fator risco associado à concessão de crédito.
Contudo, e contrariando esta tendência, o crédito concedido pela CEMAH tem vindo a aumentar neste mesmo período, 3% no 1º trimestre de 2017.
Este crescimento é um resultado evidente da liquidez desta Instituição, que apresenta um grau de transformação de apenas 55%, mas, essencialmente revela a sua natureza regional e a sua função de veículo dinamizador da economia açoriana.

 


Quais as principais áreas a que se destina o crédito? O crescimento do Turismo está a ter alguma influência?
R.: Como é sabido e apesar de toda a recente evolução favorável na economia nacional e europeia, persiste uma realidade de esmagamento da margem financeira, o que representa um desafio no contexto de operações com adequado binário risco – rendibilidade.
No que concerne ao crédito, as áreas mais representativas são as áreas do comércio e reparações, e do alojamento, restauração e similares, leia-se precisamente a área do turismo. No nosso caso, verificamos um aumento do crédito concedido pela CEMAH, já no decorrer deste ano, afeto às duas áreas referidas, o que em boa medida, resulta da recuperação da confiança por parte dos agentes económicos, bem visível no Indicador de Atividade Económica já referido.
Em análise setorial, é o setor terciário que apresenta indicadores mais animadores do processo de crédito, com destaque para os sinais do Turismo, a partir da liberalização do espaço aéreo Regional, um pouco em contraponto das apostas habituais dos setores primário e secundário (i.e. agropecuária, transformação de leite e derivados, pescas e construção civil), pelo que a Instituição estará atenta ao desenvolvimento da dinâmica dessa vertente em concreto, mas também dos negócios “satélite” que daí possam advir.

 


Vê com otimismo o crescimento do investimento no Turismo?
R.: O incremento do investimento na área do turismo segue a tendência nacional que se vem sentindo já há alguns anos e que agora se tornou uma realidade nos Açores, devido à liberalização do espaço aéreo Regional e à deslocalização dos principais mercados turísticos. O volume de negócios deste setor, a nível nacional, aumentou 6% em 2015, face ao ano anterior, conforme dados estatísticos do Banco de Portugal. Também em 2015, o número de empresas em atividade no setor do turismo aumentou 2,4% em relação ao ano anterior.
Nos Açores o incremento tem sido notável, ao ponto de já se perspetivar novo “ciclo” no desenvolvimento económico regional, resta saber com que consistência e por quantos anos…
De acordo com a informação estatística do SREA referente a maio do corrente ano, os estabelecimentos hoteleiros registaram um acréscimo homólogo de 20,1%, os proveitos totais e os proveitos de aposento, respetivamente com variações homólogas de 30,3% e 26,8%. É ainda de salientar que o desembarque de passageiros nos aeroportos dos Açores aumentou 17,3% nos últimos 12 meses, o que se traduz numa maior movimentação no nosso mercado e, por consequência, num maior investimento nesta área económica.
Perante este cenário podemos afirmar que o sector do turismo está em crescimento e é uma área onde o investimento tem vindo progressivamente a crescer nos últimos anos. Tem-se verificado a criação de empresas, expansão das já existentes e o aumento do número de postos de trabalho nesta área, o que se traduz num contributo significativo para o crescimento da economia da região, contudo é necessário acautelar um crescimento sustentado e que não crie excessiva dependência face ao futuro.
Neste contexto, vejo como muito positivo o investimento que tem vindo a ser realizado, mas, sou um otimista moderado…

 


De que forma a banca e, em concreto, a Instituição que representa apoia as empresas regionais e por consequência a economia regional?
R.: A CEMAH pretende continuar a posicionar-se como uma importante e sólida Instituição financeira ao serviço da economia dos Açores e sempre com o objetivo supremo de proteção dos seus depositantes, cumprimento escrupuloso do quadro regulatório vigente, relacionamento de excelência com as autoridades governamentais regionais e, na medida que for possível e consistente, libertação de meios através de dividendos para ajudar a cofinanciar a relevante e digna obra social da sua Instituição Titular – a Santa Casa da Misericórdia de Angra do Heroísmo.
Neste sentido, o apoio às famílias e às empresas regionais é, de facto, o principal objetivo desta Instituição. A CEMAH está investida de uma forte motivação para a obtenção de resultados que contribuam ativamente para a dinamização da economia local e do espaço económico da RAA.
Mais do que nunca a CEMAH afirma-se como banca regional, num modelo de negócio que privilegia a banca de proximidade como um elemento diferenciador da sua estratégia, quer numa perspetiva de relevância da oferta desse serviço no sistema financeiro, quer pela certeza e conservadorismo na tomada de decisão que advêm do conhecimento de cada cliente - particular ou empresa - e de cada contexto.
Hoje, a CEMAH está habilitada para responder aos desafios do novo enquadramento regulatório, de forma autónoma e rigorosa; a CEMAH repensa a sua arquitetura tecnológica, não no sentido de assegurar apenas os “mínimos olímpicos” para operar a sua atividade, mas no sentido de estar a par dos requisitos para a persecução da sua estratégia.
Sendo uma Instituição exclusivamente de cariz regional, que não esquece os fatores proximidade e conhecimento local, assume a missão de assegurar a definição e persecução de uma estratégia alicerçada no desenvolvimento sustentado, para o presente e para o futuro, contribuindo para a dignificação e fortalecimento do sistema financeiro, e do espaço económico da RAA e oferecendo soluções que não negligenciam as necessidades emergentes, por um lado, de desmaterialização e mobilidade – para o cliente bancário comum – e, por outro, de abrangência e inclusão de todos os tipos de clientes bancários por direito de cidadania, contribuindo assim para o acesso ao sistema financeiro de clientes considerados como “não rentáveis” pelos critérios utilizados pela generalidade da banca.

 


Como tem evoluído a penetração da CEMAH na RAA e como pensa evoluir na sua forma jurídica com eventual passagem a banco?
R.: Com presença em 6 ilhas da RAA, mas com uma forte penetração na Ilha Terceira e nalgumas ilhas do Grupo Central, a CEMAH tem na RAA o seu exclusivo mercado de atuação. Está absolutamente fora de questão a expansão para outros espaços, nomeadamente para o Continente. É nossa convicção que temos ainda espaço para crescer na Região, sobretudo na Ilha de São Miguel, indiscutivelmente o espaço económico regional onde se faz a maior geração de negócio e de valor acrescentado.
A abertura do primeiro balcão em São Miguel permitiu uma maior proximidade à esfera das empresas, quer privadas quer públicas, por aí se situar a maioria dos centros de decisão, e estabelecer com estas relações de negócio e parcerias mais estreitas, o que, aliás, tem vindo a acontecer com evidente sucesso.
Neste âmbito devo salientar o papel do Governo Regional dos Açores, não apenas como parceiro de negócios, mas como entidade defensora da importância estratégica desta Instituição Financeira, dada a sua natureza e seu cariz exclusivamente regional.
Perspetiva-se para breve, a abertura de um segundo balcão na Ilha de São Miguel, na cidade da Ribeira Grande, com um balanço preliminar de sucesso da nossa estratégia de expansão consolidada.
Quanto à alteração da forma jurídica, a partir da publicação do novo regime jurídico das Caixas Económicas (Decreto-Lei nr. 190/2015 de 10 de setembro), a CEMAH passou a ser Caixa Económica Bancária e perspetiva-se que em breve seja transformada em sociedade anónima. Tal transformação decorre da aplicação do referido Decreto-Lei (e consequente determinação por parte do Banco de Portugal) e aceitação da Santa Casa da Misericórdia de Angra do Heroísmo (única proprietária da CEMAH), tendo nesta primeira fase, apenas e exclusivamente como objetivo a proteção do próprio capital social da Caixa Económica. A eventual abertura desse mesmo capital a outros acionistas, no âmbito da economia social, não está para já nos nossos horizontes, mas não deixará de ser um dossier que a nossa entidade titular, a Santa Casa da Misericórdia de Angra do Heroísmo (SCMAH), analisará em devido tempo e da sua eventual conveniência, sendo certo que qualquer decisão nesse âmbito será sempre da exclusiva competência da nossa entidade titular.

 

 

 

In Açoriano Oriental, 23 de julho de 2017, p. 6-7

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